sábado, 6 de janeiro de 2007

Judiar, judiação, judiaria

Judiar, judiação, judiaria

Por: Samuel Szerman

De princípio gostaria de declarar que não sou autoridade em português. Sou apenas um pouco mais curioso e interessado em conhecer o idioma que a média das pessoas. Desde o tempo dos bancos escolares. Sempre tenho a quem recorrer quando surge alguma dúvida ou divergência com respeito á língua portuguesa.

Atualmente, recorro à brilhante professora Dad Abi Chehine Squarisi, libanesa cristã, naturalizada brasileira, minha amiga que, além de editora da seção "Opinião" do Correio Braziliense, tem uma coluna chamada "Dicas de Português", no mesmo jornal. Ela já lecionou na Universidade de Brasília e no Instituto Rio Branco. Hoje, dedica-se exclusivamente ao jornalismo.

Meu maior interesse no estudo de nossa língua é a semântica. Dito isto, passo ao assunto propriamente dito no titulo deste artigo: Judiar, judiação, judiaria. Muitas palavras têm seus significados modificados, transformados e, até adquirem sentido contrário ao original. Passemos a alguns exemplos:

Bárbaro: Significava, para os antigos gregos e romanos, elemento de nação ou raça diferente, estrangeiro. Hoje, é sinônimo de cruel, desumano. Registra-se, também, a acepção de uma coisa ótima, surpreendente.

Crioulo: Antigamente, escravo nascido no continente americano, ou filho de europeus nascido nas Américas. Atualmente tem sentido pejorativo, ou carinhoso, usado para negros em geral.

Esplêndido: Primitivamente, o que brilhava. Por extensão, hoje, em sentido figurado, coisa suntuosa, luxuosa, ótima.

Esquisito: Antigamente, raro, elevado, exótico. Nos nossos dias, tem vários significados, todos negativos. (Estranho, feio, mal-humorado, etc.). No idioma espanhol, conserva o sentido original.

Formidável: O sentido original era: "que ultrapassa as dimensões normais, colossais, gigantescos." Nos nossos dias significa ótimo, excelente, fantástico. As formas paralelas formidando e formidoloso conservam o sentido primitivo. Em francês e espanhol, a palavra "formidable" sofreu a mesma transformação semântica.

Loja: Antes do sentido atual, o pavimento térreo de uma construção. Por extensão, casa térrea. Baseados nisto, os maçons denominam "lojas", seus lugares de reuniões. Atualmente, tem o sentido de estabelecimento comercial.

Vagabundo: Outrora, significava quem levava vida errante, vagava, perambulava. Hoje, quem vive no ócio e, por extensão, pessoa ou coisa de má qualidade. Na forma feminina, adquire o sentido pejorativo e preconceituoso de mulher de "mau comportamento" sexual, prostituta. Pode ser, até, uma grande trabalhadora.

Finalmente analisemos os termos judiar, judiação e judiaria. Poucos sabem disso, aí incluindo os próprios judeus, mas o primeiro significava "maltratar os judeus". Era um verbo intransitivo. O objeto direto estava subentendido. Hoje, judiar, pela semelhança do vocábulo com judeu, judia, Judas e Judá, cria uma natural associação de idéias, considerando o judeu como o agente da crueldade. Curiosidade: Tornou-se verbo transitivo indireto. "Judiaram dele". É claro que, se o verbo pede um complemento, na afirmação, está subentendido o agente. A palavra já está tão arraigada no uso popular que há quem nem faça a associação. Entretanto, a ofensa aos judeus permanece. É subliminar. Contribui enormemente para incrementar o anti-semitismo.

Judiação pede menos explicação. É um derivado gramaticalmente correto de judiar. Gramaticalmente. Politicamente, NÃO!

Judiaria: Outra forma gramaticalmente correta que pode significar um sinônimo de judiação, ou coletivo de judiações! Já li e ouvi estes sentidos. Não me senti bem. Pouquíssimas pessoas, judias ou não, têm ciência que Judiaria era o nome dado, na Península Ibérica ao bairro Judeu, tal como Mouraria era o dos mouros.

Aqui explico que a discussão sobre o sentido pejorativo ou não dos termos na berlinda não é uma questão doutrinária ou religiosa. É do idioma. É gramatical. Para se obter uma base, não se consulta o rabino, e sim, o professor ou o entendido em português. Por maiores que sejam meu respeito e minha consideração pelo rabino Henry Sobel, lembro que ele, apesar de lisboeta de nascimento, é americano e sua língua materna é o inglês. Em questões de português, fico com meus conselheiros professores, entre eles, alguns latinistas. Estas afirmações reportam-se a um pronunciamento do referido rabino, muito bem respondido por José Júlio Rozental.

Creio que, com esta exposição, consegui também explicar minha luta, que reconheço quixotesca, contra o uso de tais ofensas subliminares. Não tenho a pretensão de elidir do vocabulário popular esses verdadeiros palavrões. Quero, sim, suprimi-los dos principais meios de comunicação de massa. Vários jornais de elevado conceito proíbem este uso em suas páginas.

Fernando Levisky, Z'L, grande brasileiro, grande judeu, grande advogado e, também, vereador no Rio de Janeiro, fez uma campanha que foi vitoriosa para eliminar termos pejorativos e/ou injuriosos contra grupos étnicos, profissionais, regionais, religiosos, etc. Se muitos de nós vigiássemos, reagindo imediatamente a esta verdadeira provocação, ainda que, às vezes, inconsciente eliminaríamos o mau uso de tais palavras no rádio e na televisão.

Finalizo dizendo que as palavras valem pelo seu sentido atual, e não, pelo histórico ou primitivo. Só se entende o significado anterior em texto da respectiva época. Ex.: "e foi logo empurrado para uma grande sala que a vastidão de uma mesa opípara enchia com esquisitos manjares, faisões, cristais cantantes (João Ribeiro, Floresta de Exemplos, p. 224)".

PS. As definições foram baseadas no dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. A citação é do Novo Aurélio.

* Samuel Szerman é Relações Públicas da Petrobrás aposentado, ex-professor de Relações Públicas das faculdades no Rio de Janeiro: Hélio Alonso, Estácio de Sá e Faculdade de Filosofia de Campos, conferencista convidado esporadicamente da Gama Filho; em Brasília: UPIS (União Pioneira de Integração Social) e CEUB (Centro Universitário de Brasília); ex-membro do Conselho Regional de Relações Públicas – RJ; ex-membro do Conselho Federal de Relações Públicas; atual presidente da ACIB - Associação Cultural Israelita de Brasília.

http://www.visaojudaica.com.br/Fevereiro2005/artigos/15.htm

www.pilb.t5.com.br

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